“Congela o tempo pra eu ficar devagarinho”, Tulipa Ruiz canta versos
da sua Efêmera, que eu adoro, cá no meu ouvido enquanto penso em palavras para
preencher a folha, ávida, mas nem tanto.
Se congelar o tempo só na canção já está de bom tamanho. Por aqui a
chuva, falada em versos e prosas anteriores, há dias fez dessa bandas a sua
morada e não demonstra intenção de ir embora. Chove que só! E o mais engraçado,
sendo que graça não há nenhuma, é que ela decerto acha que o meu quarto é um
pedaço do sertão. Eu já falei, cantei, supliquei: “chova um pouco mais pra lá,
banhe aquela plantação ali”, mas não tem jeito, ela gostou de fazer cachoeirinhas
a escorrerem pela parede. Depois de ter gasto uma grana numa reforma inacabada,
perceber que um bocado de coisa está literalmente indo por água a baixo, dormir
na sala é massa, mas não muito. Mas, o que são umas cachoeirinhas de nada no
meu humilde canto do dormir, enquanto uma região toda está com o olho cheio d’água
da chuva, chorando esperança?
O tempo esfriava. As nuvens todas se desmanchavam em água e eu aqui,
rasgando recortes de revista, colando uns nos outros, repetindo moda na minha
mesa do computador. Gosto imensamente desse trabalho meio louco, digno de uma
paciência enorme. Sem tesouras, apenas as mãos e os recortes rasgados e colados
de modo a se encaixarem num imenso estampado. Já havia feito isso em cadernos,
agendas, caixinhas, mas desse tamanho, não senhor! É que o Ansiopax está caro
que só! E enquanto eu rasgava aqui e acolá, esquecia o quanto pensar pode ser
cansativo e dolorido.
Enquanto congelava o tempo na canção, esfriava o tempo de se sentir,
pros lados de lá as coisas aconteciam como sempre, com a mesma besteirice ou
absurdez. O Maracanã foi reaberto com uma festança das boas. A Presidente
estava lá e eu não sei por que não a fizeram ter uma participação maior, como por
exemplo, atuar como bandeirinha. O povo amaria recitar poemas lá da
arquibancada e ela, comovida, retribuiria com outro programa no melhor estilo
bolsa de ser. Que tal um projeto voltado para a vaidade do povo brasileiro, da
mulher principalmente, mas com participação especialíssima do homem, que
poderia se chamar “Bolsa Chapinha – seu cabelo sempre na linha”... Acho digno.
Falei pro Itallo que estava rabiscando, ele disse: “Quintane-se”.
Sinto desapontá-lo ao derramar aqui o meu paiol de bobagens costumeiro. Ainda
bem que o Quintana não frequenta blogs, ele só gosta das páginas amareladas dos
livros antigos e os lê enquanto o tempo não tem pressa, no lado de lá. O que é
o tempo no lado de lá? Não darei conta de tanta filosofia, isso é coisa pro
Itallo, que no frescor dos seus vinte anos talvez nem suponha o quanto eu gosto
de aprender com ele nessas nossas prosas da madrugada.
Eu tenho que ir, porque inventaram uma coisa de se ter que ser gente
grande, acordar cedo mesmo que cachoeiras se derramem no seu quarto, cumprir
bacaninha um dia de trabalho e outros etecéteras. Chato isso de se ter que ir.
Agora é o Humberto Gessinger que me encanta os ouvidos, dizendo “volta
pra casa, me traz na bagagem, sua viagem sou eu”... Versos de amor. Do amor eu
não falo. Não sinto. Eu minto.
Inté mais ver.
RASGA, COLA E ESTAMPA...